Claude Troisgros, o chef aventureiro
A definição que o francês apaixonado pelo Brasil e pelos temperos tropicais mais aprecia é a de um simples “cozinheiro”, que adora cair na estrada conhecendo e misturando sabores e experiências.
“Acho que você nasceu no país errado não?”, disparou, em tom divertido, Pierre Troigros para o filho Claude que, aos 24 anos, no final de 1979, se mudou de Roanne, um vilarejo de 50 mil habitantes no centro da França, para montar o restaurante Le Pré Catelan, no Rio de Janeiro, e nunca mais voltou. Verdade é que Claude, chef francês apaixonado por sabores exóticos, extrovertido, aventureiro, encontrou em terras cariocas - e no Brasil - um estilo de vida que o encantou. “Meu pai diz que realmente tenho um modo de me relacionar típico dos brasileiros. Saí de Roanne, onde nasci, para uma Copacabana intensa e ensolarada. Meu contrato inicial no Pré Catelan era de dois anos, mas me apaixonei pelo lugar, por uma mulher, casei, tive filhos e resolvi ficar por aqui. Aos poucos, comecei a conhecer o país de ponta a ponta, comprei uma moto e peguei a estrada. Isso me fez ter uma outra dimensão dos trópicos, inclusive gastronômica. Um caminho sem volta”, revela. Filho de Pierre Troisgros e sobrinho de Jean, ambos chefs que pilotam, em Roanne, o Troigros, restaurante “estrelado” da família, Claude nasceu entendendo que sua relação com a gastronomia era uma vocação natural, quase inevitável. “Eles foram precursores do movimento da Nova cozinha francesa, que modernizou várias técnicas entre os anos 60 e 70. Sou a terceira geração dessa família e sigo no mesmo métier”, revela. Por aqui, ele foi além: uniu a culinária mais tradicional francesa com os sabores exóticos brasileiros, como a macaxeira e a jabuticaba. “Nos anos 80, a gente colocava quiabo no pato com laranja e o cliente devolvia o prato, indignado. Aos poucos, mostramos que os ingredientes podem se misturar, dependendo da técnica. Eu, por exemplo, adoro jabá com jerimum, regado à manteiga de garrafa, ou seja, uma boa carne seca com abóbora que conheci pelo Batista, meu cozinheiro que virou amigo e braço direito. Ele fez questão de apresentar essa iguaria para mim, com tanto afeto e delicadeza, que virou meu prato preferido”. Aventureiro nato, Troigros admite que as viagens se tornaram um vício. Todo ano, ele reserva de 3 semanas a um mês para sair de moto - em geral sozinho - por algum canto do Brasil ou América Latina. “Só não conheço a Colômbia”, pontua. A experiência de sentir o vento no rosto e explorar pequenos recantos é, para ele, uma forma essencial de estar no mundo e de pesquisar novos sabores e misturas. “Minha primeira paixão é a cozinha. A segunda, moto. Ando desde muito jovem. E viajar dessa forma é também um meio de conhecer gente, porque vou para cidades pequenas, paro no meio da praça e logo fico cercado de crianças curiosas, depois vêm os pais, que invariavelmente se aproximam e me chamam para um café, provar um bolo, uma comidinha especial. E esse contato com a cultura local virou uma filosofia de vida para mim. Um processo que me alimenta de ideias e que mostro também no ‘Mesa ao Lado’, restaurante mais pessoal, uma experiência de imersão na minha trajetória e no que acredito”, explica ele. Inaugurado há cerca de dois anos, o ‘Mesa ao Lado' tem apenas 12 lugares e fica vizinho ao Chez Claude e à Cantina do Claude, no Leblon, zona sul carioca. A proposta é intimista mesmo: quem vai tem o prazer de degustar um menu de cerca de nove pratos e entender um pouco do estilo Troigros de ser e receber. Mais do que um restaurante, é uma vivência. “Queria trazer a sensação do olfato, de como se chega ao gosto de cada prato, algo bem pessoal e conceitual. Convidei o artista multimídia Batman Zavareze para um papo e pensar comigo nessa proposta. Conversamos por quase uma hora, tomando cachaça, e no final ele disse que não tinha entendido nada, mas que adorava o desafio de fazer algo que não compreendia. E assim foi. Conseguimos criar no Mesa algo muito diferente, bem especial”, reflete ele. Esse jeito carismático de Claude acabou o transformando em uma celebridade, sucesso total nos programas que pilota há 17 anos na TV - canal GNT (Globosat). “Os diretores com quem trabalhei dizem que sou ‘camera friendly’... será? Acho que o segredo é ser simples e verdadeiro em tudo o que faço”, afirma.