Artes _ 28 março _ por Simone Raitzik

Irmãs Gelli: aposta criativa na cena artística brasileira

Alice foca no processo de criação. Gabriela é ligada na produção. Juntas, elas formam uma espécie de sociedade que vem se firmando como uma aposta das mais criativas na cena artística brasileira.

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Irmãs, amigas, parceiras, elas dividem um simpático apartamento térreo em Ipanema, zona sul do Rio de Janeiro, com quintal nos fundos, que serve de casa e atelier. Mas Alice, 32, e Gabriela, 27, partilham muito mais do que um mesmo endereço e o sobrenome: elas são donas de um olhar criativo e um senso estético em total sintonia. Trabalhar juntas, como “sócias” de uma produção artística, aconteceu quase por acaso, por conta da pandemia. Forçadas a ficar longas temporadas presas sob o mesmo teto, descobriram que criar a quatro mãos era um enorme prazer - e muito mais produtivo. “A primeira coisa que nos perguntam é ‘como é que você consegue ter tanta troca com sua irmã’? Essa dinâmica não é desgastante?’. Verdade é que temos total intimidade e percebemos que, juntas, funcionamos em alta potência. Há diálogo, uma vai melhorando a ideia da outra. Esse processo se tornou um vício”, conta Alice. Filhas de Fred e Patrícia Gelli, a dupla que criou a Tátil, o estúdio de design responsável pelo logo das Olimpíadas do Rio e referência no mercado brasileiro, Alice e Gabriela cresceram em meio a um universo artístico dos mais instigantes. Ambas se formaram em Design pela PUC-Rio, onde os pais também estudaram. “Às vezes, nos jantares de família, nos pegamos discutindo algo de um projeto que começamos a desenvolver, buscando soluções para questões técnicas. Somos muito ligadas em novos materiais, exploramos diferentes plataformas e acho que essa versatilidade vem muito do universo do design, que é uma linguagem comum aqui em casa”, revela Gabi. Longe de glamourizar o dia a dia, Alice e Gabi afirmam que para cada nova ideia tem muita pesquisa por trás. “É um trabalho diário, árduo. As obras que produzimos são resultado de um milhão de testes. Para trabalhar com a cera, por exemplo, ficamos mais de um ano para encontrar o ponto certo, definir as cores que funcionariam, checar a durabilidade. O atelier, para nós, é pura disciplina: um trabalho intenso”, diz Alice. Recentemente, elas contrataram duas ajudantes e admitem que essa troca tem sido extremamente importante. “Acreditamos demais no coletivo. Muitas cabeças e mãos fazem diferença, só somam”, arremata Gabi. O processo de criação da dupla tem algumas particularidades: Alice é do dia; Gabi, da noite. Cada uma tem em mente que respeitar o estilo de vida da outra é fundamental para o resultado ser fluido e harmônico. “O atelier funciona a pleno vapor, em geral, entre 11 e 19hs. Tentamos limitar esse horário porque estamos dentro de casa, literalmente”, conta Gabi, que admite ser, assim como Alice, completamente obcecada por desafios e complexidades. “Adoramos complicar as coisas. Isso nos instiga a pesquisar e a buscar soluções”. Outro ponto que ambas concordam é a vontade de fazer uma arte que encurte a distância com o público. “Muitos acham que arte é algo inacessível ou indecifrável. Queremos mostrar, com nosso trabalho, que é para todo mundo”, explica Alice. Ela dá como exemplo a recente performance “Encontro Presencial”, realizada durante a exposição que ocupou a Lurixs Galeria, no Rio. “Ficamos rodando, em uma base, praticamente no meio da rua, com um maçarico na mão, derretendo um grande cubo de cera para abrir um túnel no meio. As pessoas paravam, olhavam, e as reações eram incríveis”, diz. Agora, elas estão em cartaz com uma montagem no Art Wall do Shopping Leblon: uma instalação na circulação de 12m na entrada do mall. Ainda este ano, têm na agenda uma exposição - interativa - ocupando duas salas do Centro cultural dos Correios e, em seguida, outra mostra programada na Galeria Brisa, em Lisboa. “Para cada evento, partimos do zero e desenvolvemos trabalhos diferentes. Encaramos essa programação como uma oportunidade de fazer algo novo, surpreendente, testar ideias. Nossas cabeças não param”, acrescenta Gabi. - Entrevista e texto: Simone Raitzik. Produção, captação e edição de imagens: Felipe David Rodrigues. Imagens adicionais: Arquivo Irmãs Gelli. Editor responsável: Renato Henrichs.