Miguel Pinto Guimarães: "Fazer uma casa é diferente de fazer um lar"
O arquiteto carioca defende que a arquitetura deve surpreender todos os sentidos e que espaço bom é aquele feito para se viver, e não apenas para se ver.
O cenário é deslumbrante. Diante da praia de Ipanema, a claridade do sol de verão carioca invade a cobertura do prédio de 5 andares projetado por Oscar Niemeyer, e que foi a morada de Juscelino Kubitschek quando deixou a Presidência da República no início dos anos 1960. Miguel Pinto Guimarães abre as portas deste seu apartamento com arquitetura de interiores respeitosa ao original, restaurada pelo casal de novos moradores para receber a familia formada por eles e seus filhos de casamentos anteriores, além de Joaquim, o caçula dele e de Paula ali presente aos nove meses de pura graça. O salão hoje integra living, escritório, cozinha e uma surpreendente área externa com grandiosidade, funcionalidade e um gosto apuradíssimo para a arte focada na década de 60, paixão de Paula, e de um mobiliário essencialmente modernista que passeia pelo melhor design da época em exemplares originais de autores que vão de Zanine, Tenreiro, Zalszupin e Sergio Rodrigues a Nakashima ali representado em mesa, cadeiras e sofás raros entre nós, além de cadeiras da turma suiça Jeanneret / edição Chandigarh - um luxo! O buffet do americano Paul Evans é sensacional. Por ter sido uma criança curiosa que já fazia plantas baixas e cortes detalhadíssimos desde os 9 anos (quando lia e se inspirava nos cenários de Rudyard Kipling e Julio Verne) e, como adolescente aos 15, ter conquistado seu primeiro estágio em arquitetura, Miguel formou-se em 1997 e mantém seu escritório MPGAA desde 2003, depois da sociedade emblemática com Thiago Bernardes, ambos aos 18 anos, e depois também com Paulo Jacobsen. Em seus pontos de vista profissionais muito bem sedimentados, ele reafirma: “proporção é a base de tudo”, “o espaço tem que ser bom para se viver, e não para se ver”, “temos que surpreender todos os sentidos, até o sexto”. E, observador inteligente com pensamento habilidoso, Miguel percebe, no Brasil, a importância do repertório modernista, em suas adaptações ao clima tropical, e até politicas… Autor de projetos tão variados quanto os de escolas, restaurantes, museus e escritórios, é nas casas que ele mais se realiza. Em 2019, em parceria com o arquiteto Sergio Conde Caldas, tornou-se empreendedor quando eles criaram juntos a Opy (ler Opã) e lançaram o primeiro produto, projeto de um condomínio de 4 casas no alto do bairro do Jardim Botânico com muito sucesso, chamado Opy-Ará. Isso levou a dupla a desenvolver o projeto Vila Carnaúba, no Ceará, que deixa para trás o conceito tão difundido dos condomínios de casas de alto padrão, tão-somente, para se (pre)ocupar também com o crescimento da região - do projeto no seu todo até a moradia popular que faz parte da arquitetura “sal no corpo”, como Miguel define seu fazer carioca e agora nordestino. Não menos importante, ele nutre outra paixão que o faz ir fundo na leitura e na pesquisa: a cenografia teatral, um incentivo natural de troca de trabalhos entre Miguel e Maneco Quinderé, amigos de fé que trocam ideias e integram trabalhos no teatro e na arquitetura: “fazer um castelo para Hamlet ou uma casa para Tchecov faz você diversificar os clientes por países e milênios”, Miguel imagina… e encerra de forma sempre criativa e entusiasmada seu depoimento para a nossa FLO.