Milano Fashion Week: estreias e novas tendências
Milão se transforma em um palco para os desfiles das coleções outono-inverno 2024/2025, com muitas estreias e novas tendências. Os grandes nomes e os gigantes da moda são inevitáveis.
ANTONIO MARRAS E A SARDENHA MEDIEVAL Marras tem uma história importante não só na moda assim como na arte, no design e no teatro e é vencedor de vários prêmios como Milano Design Award e Accademia di Belle Arti di Brera. Nascido em Alghero, na Sardenha, Marras este ano homenageia Eleonora d'Arborea, que reinou na ilha italiana nos anos 1300. "Eleonora d' Arborea foi uma soberana à frente do seu tempo, atenta ao papel e à independência da mulher", explica a escolha. A cenografia é composta por amoreiras e vinhas que cobrem a base de uma torre no centro de uma plataforma quadrada. Por esta fortaleza passam as damas e os cavaleiros desenhados por Antonio Marras. A Idade Média de Marras vem com vestidos leves ou casacos quadrados. Os vermelhos e pretos são fortes. Os dourados também estão presentes. Uma noiva opulenta vestida de branco com um grande cocar de folhas brancas e uma gaiola no rosto encerra o espetáculo.
DIESEL: MUITO ALÉM DO JEANS O desfile outono inverno 2024-25 da Diesel foi mais uma vez democrático e aberto ao público. E este ano a grife foi além, como conta Glenn Martens, diretor criativo da marca: "Nesta temporada abrimos a Diesel para o mundo, dando acesso gratuito aos bastidores nos dias anteriores ao desfile.” Durante mais de 72 horas antes do desfile, um streaming revelou ao mundo imagens de Martens trabalhando com sua equipe, no ateliê, enquanto finalizavam a coleção. A coleção toda é permeada pelo jeans, que é ofuscado pela introdução de peças de pele sintética, combinadas com malhas em babados, que causam um efeito vibrante em casacos, jaquetas, saias e boleros, bem como em chapéus e no forro de capuzes. O acabamento "destroyed" das jaquetas e jeans reaparece, assim como as camadas do denim revestido, devoré ou jacquard. O estampado de leopardo surge acompanhado do floral numa espécie de transparência, ou corroído pelo trompe l'oeil de jeans. Peças de jersey devorè parecem queimadas sob os braços e no peito, como se o suor as tivessem sido desgastado.
FENDI: INSPIRAÇÃO 80th Cortinas do chão ao teto intercalam o salão do desfile outono-inverno da Fendi, dando um efeito teatral, envolvendo a coleção, inspirada nos arquivos de 1984 da maison. "Os esboços evocaram em mim a memória de Londres naqueles anos, entre o New Romantic, o workwear, as inspirações japonesas e o estilo aristocrático. Naquela época, a subcultura britânica influenciava o mundo”, sublinha Kim Jones, diretor criativo de alta costura e moda feminina da Fendi Mas, como sempre, o estilista resgata a cultura romana que surge como uma homenagem à tradição da família Fendi. Com os cabelos presos, as modelos usam jaquetas rigorosas com ombros arredondados e calças modeladas ou casacos severos em lã compacta. Golas de malha tipo lenço são costuradas em casacos e camisas, enquanto suéteres falsos ficam indiferentes nos ombros. Tubinhos de couro se alternam com vestidos justos, percorridos por zíperes infinitos.
ALBERTA FERRETTI, DE MULHER PARA MULHER A trajetória de Alberta Ferretti vem de longa data. Em um segmento liderado por homens, Ferretti destaca-se desde cedo quando aos 18 anos abre a sua primeira boutique, em 1980, lança a sua grife, a Aeffe, até começar a colaborar com Moschino, Jean Paul Gaultier entre outros. Hoje, Aeffe é uma potência nos nichos da moda e do luxo. Ferretti sempre explorou o equilíbrio entre pragmatismo e poesia. Fala diretamente com mulheres, sonha mantendo os olhos abertos e os pés no chão. Nesta temporada, o caminho estilístico parte dos materiais, e das oposições mais clássicas - masculino e feminino, compacidade e leveza, solidez e evanescência, chiffon e flanela, renda e chevron - para ganhar forma numa inversão de perspectivas, seguindo novas abordagens. A coleção recapitula temas caros a Alberta - os slipdresses e a alfaiataria, os casacos envolventes e os drapeados líricos, mas também a ideia de oferecer peças que possam ser usadas e interpretadas de muitas maneiras. A opacidade masculina dos tecidos diurnos encontra contraponto no brilho ousado dos bordados como medalhões, lantejoulas, baguetes e strass à noite.
MAX MARA: GUARDA-ROUPA ECLÉTICO E LIVRE Max Mara apresenta na Milano Fashion Week uma coleção minimalista, inspirada no espírito rebelde e criativo da escritora e jornalista francesa Colette. Ela viveu no fim do século XIX e foi um ícone da Belle Époque, tornando-se um símbolo de emancipação e inconformismo. O guarda-roupa combina o rigor da roupa masculina (a própria Colette muitas vezes vestida de homem) com a sensualidade das peças típicas do estilo boudoir com algumas referências à estética japonesa. Juntamente com o estilo do talentoso Tonne Goodman, a marca atualiza o estilo de Colette misturando-o com o americano Office Siren (sereia de escritório), que hoje é muito popular no TikTok.
PRADA RECONTEXTUALIZA A HISTÓRIA Intitulado "Instinctive Romance", desfile da coleção outono-inverno da Prada confirma a atração da grife pela história. A coleção de Miuccia Prada e Raf Simons funde moda com fragmentos históricos numa exploração de conceitos de beleza, de um mundo contemporâneo feito de memórias. Prada conta a história através da moda. O local do show é um terrário montado na Fundação Prada, com cenário assinado pela AMO. O exército de mulheres Prada segue em ritmo acelerado: usam chapéus de agente, defendendo o conceito de beleza nesta semana de moda. Prada questiona diferentes épocas, sentimentos e estilos. Elementos históricos de grande peso se fundem com peças leves, quase impalpáveis: o vestido bordado flutua sobre as botas, o blazer trespassado cobre o vestido de seda, os suéteres jacquard metalizados repousam sobre as saias transparentes em tons pastéis, o color-block dos conjuntos duplos em saias lápis rigorosas. Detalhes românticos, como laços, recortes, babados e orlas de pele, trazem para o guarda-roupa mais severo uma dose de feminilidade. As sapatilhas ficam pontudas, as icônicas bolsas são usadas no braço graças às alças das pulseiras.
MOSCHINO, O RECOMEÇO O desfile outono-inverno na Milano Fashion Week marca a estreia do argentino Adrian Appiolaza, o novo diretor criativo da Moschino, que retoma a ironia do fundador Franco Moschino. “Cheguei em janeiro, gostei da ideia de trazer a Moschino para esse novo capítulo. Tenho uma grande paixão pelo arquivo e pelo vintage e por isso decidi investigar o arquivo de Franco", o estilista, recém-contratado, explica suas escolhas frente ao curto tempo que teve para idealizar a nova coleção, devido a morte repentina do diretor criativo, Davide Renne. A coleção relembra o passado para lançar as bases do futuro. Em clima casual e bem humorado, aparecem maxi bolas, mensagens de paz, o ponto de interrogação como um questionamento irônico ao presente, sacolas rede preenchidas de baguetes e legumes surgem como bolsas, o trench coat vem enriquecido com longo colar de pérolas, gravatas em mosaico, looks totais de lenços e sobreposições inesperadas Os códigos tradicionais vivem em subversão com a camisa, usada na cabeça e enrolada como um turbante. Outros looks permanecem quase intactos, como o famoso vestido italiano, retirado diretamente da coleção de 1994.
O BRILHO DE EMPORIO ARMANI "Bagliori di Notte", que faz referência ao brilho da noite, é título da nova coleção da Emporio Armani. No desfile que apresenta o guarda-roupa outono-inverno em Milão, Giorgio Armani homenageia a noite estrelada de lua cheia. As modelos entram sorrindo sobre a passarela do Teatro Armani que, em certos momentos, é tomada por nuvens de neve. Elas não se assustam com o mau tempo e trazem a poeira estelar, graças a um guarda-roupa predominantemente noturno e repleto de luzes. Constelações bordadas em casacos severos apenas na atenção aos cortes para dar silhuetas matematicamente próximas da perfeição, colares em cascata circundam o decote como anéis de planetas muito próximos do poder de Vênus . Armani apresenta uma mulher que, à noite, se atreve a exibir vestidos que são flashes de luzes, macacões de lantejoulas e tops como redes de estrelas.
TOM FORD E A ARTE DA SEDUÇÃO Sharon Stone, Uma Thurman, Amber Valletta. O desfile de Tom Ford é um dos mais disputados pelas celebridades de Hollywood. Sob a batuta, pelo segundo ano, do criativo inglês Peter Hawkings, a coleção outono-inverno abraça a herança da marca em todo o seu esplendor, com um desfile que aposta na arte da sedução. Carpete escuro, poltronas de mármore e trilha sonora do filme "Instinto Fatal". A mulher de Hawkings exala audácia e sensualidade. Desfila macacões arrastão que revelam quase todo o corpo, enquanto os vestidos com detalhes recortados mostram graciosamente a silhueta. Vestem blazers e blusas combinadas com shorts de corte ousado. Os casacos de inspiração militar lhe dão força e determinação. Sapatos de salto acentuado e joias douradas dão um toque a mais de requinte. Enquanto os óculos grandes e quadrados passam um ar misterioso e sofisticado. O homem interpreta os mesmos códigos estéticos. Alfaiataria impecável, toques dourados e uso habilidoso de materiais – do couro às lantejoulas.
LORO PIANA: 100 ANOS DE ELEGÂNCIA Em comemoração aos 100 anos, Loro Piana lança sua coleção outono-inverno através de uma viagem por fibras, tecidos e formas. A coleção celebra os valores fundadores e duradouros da maison: artesanato, expertise técnica e uma visão pessoal da elegância. A marca este ano concentra-se na associação histórica com o "fiore di cardo" (ou flor de cardo), presente em estampas, texturas, joias e buquês, distribuídos aos clientes. Desde a utilização da máquina de cardar – uma ferramenta equipada com as flores de cardo para escovar e levantar a caxemira, alcançando a sua textura única – até a sua incorporação no brasão em 1951, o cardo sempre foi uma grande referência para a Maison . Lançada em apresentações especiais em vez de desfile, e coleção explora as excelências exclusivas dos tecidos de Loro Piana, incluindo Cheviot, Vicuña, caxemira e Baby Cashmere. E investiga seus arquivos para reintroduzir sua assinatura Pecora Nera®, proveniente exclusivamente da Nova Zelândia, bem como a lã Sopra Visso das montanhas Sibillini, na Itália. A coleção feminina mistura liberdade e elegância, ligeiramente masculinas com uma nova afirmação de feminilidade. A alfaiataria é feita com uma mão suavemente construída, e os detalhes lembram os encontrados nos guarda-roupas de Sergio e Pier Luigi Loro Piana. Casacos compridos e roupas de seda líquida são justapostos com anoraks e jaquetas utilitaristas. O guarda-roupas masculino aparece com volumes cheios, as roupas movem-se naturalmente ao redor do corpo. Blazers não estruturados e camisetas folgadas são formalmente informais na sua precisão limpa mas flexível. Os casacos têm a amplitude de uma herança de família com um sentimento de facilidade vivida, com detalhes relembrando os guarda-roupas dos fundadores, Sergio Loro Piana e Pier Luigi Loro Piana.
A INDOMÁVEL VERSACE Neo punk e showbiz, couro preto e vermelho escarlate: no reino de Donatella Versace. "Esta coleção tem um caráter rebelde e um coração bondoso", diz Donatella. As roupas pegam os códigos da alfaiataria contemporânea e os derrubam com cortes, drapeados e enfeites. A coleção Versace foca nas linhas puras, tecidos inovadores em uma indomabilidade racional. O desfile misto outono-inverno traz uma nova ideia de power dress para a passarela com leggings de estribo, casacos longos sob medida, saias drapeadas, calças de couro e golas brancas estilo Wednesday Addams. As referências da indumentária ganham vida com um clima punk: homens e mulheres desfilam pela intrincada passarela, feita de escadas e corredores, com o passo ousado e sinuoso que se tornou a marca registrada da Versace. Há uma coleção de contrastes, inclusive cromáticos. O rigor do preto ganha vida com pinceladas de laca vermelha, golas brancas iluminam os sinuosos vestidos totalmente pretos. Depois dão lugar aos ternos de brim, tweed, couro cor de café, até a explosão final do prateado.
AS LISTRAS HIPNÓTICAS DE MISSONI Missoni tem sempre o poder de hipnotizar com suas listras e o zigue-zague icônicos. Nesta coleção outono-inverno, as listras predominam e aparecem maxi e mini. Numa alternância entre masculino e feminino, peças de alfaiataria com ombros oversized, tops e saias longas envolventes, macacões, vestidos longos que caem e drapeados que misturam a ordem das listras paralelas. Listras em pele e pelúcia cruzam as peças monocromáticas com movimentos circulares, listras pretas e brancas e listras multicoloridas. A novidade da estação: leggings-botas de salto listradas, também chamadas de botas meias longas, surgem como acessório fetichista de toda a coleção.
GUCCI: A MARCA DO DESEJO No seu segundo desfile como diretor criativo da Gucci, Sabato De Sarno reconfirma a sua interpretação da herança da maison. "Os meus sonhos, tal como a minha moda, dialogam sempre com a realidade. Porque não procuro outro mundo para habitar, mas, sim, formas de habitar este mundo”, diz Sabato, após apresentação da coleção outono-inverno em Milão. Casacos usados como minivestidos ou vestidos longos, culotes que funcionam como shorts, jaquetas safari e vestidos esculturais e com fendas profundas. São roupas fáceis de usar em qualquer ocasião, principalmente num momento em que se requer praticidade. As cores chamam atenção. Depois dos cinzentos, acompanhados de botas altas de couro vermelho. Ainda aparecem o mostarda, o caramelo, o rosa peau d'ange e diversos tons de verde. E ainda o amarelo limão, o ameixa e o azul que desbota graças à combinação de tecido, cristais e lantejoulas em reflexos prateados cintilantes. Para fechar o figurino, não poderiam faltar, é claro, os acessórios, ícones da marca. Com as novas bolsas, cintos e calçados, Sabato perpetua o poder da grife em alimentar desejos.
FERRAGAMO: A ELEGÂNCIA ANOS 1920 Maximilian Davis, diretor criativo da Ferragamo, inspira-se no surrealismo do pós-guerra para criar a coleção outono-inverno, apresentada em Milão. “Adoro partir da riqueza da história, depois destilá-la e torná-la mais limpa e moderna”, explica Davis. Penas, franjas e transparências adornam vestidos melindrosos. O tecido cru é protagonista não só da capa Ferragamo, mas também das jaquetas e casacos longos masculinos, numa paleta que vai do oliva ao chocolate e ao vermelho. Saias Charleston caracterizadas por longas franjas despontam sutilmente embaixo de jaquetas e vestidos, enquanto nos pés, botas e sandálias de penas. As mulheres, que antes usavam calças, agora usam vestidos midi em organza laqueada e minivestidos de seda. Ternos sob medida imitam os uniformes da época, caracterizados por um toque utilitário.
BOTTEGA VENETA: GUARDA-ROUPA RESILIENTE A começar pelo espaço onde foi realizado o desfile outono-inverno da Bottega Veneta, Matthieu Blazy redesenha um mundo funcional, onde é possível sobreviver e renascer. O cenário parece um deserto, onde o pôr do sol destaca a sombra de esplêndidos cactos, enquanto os hóspedes estão sentados em bancos Le Cabanon, de Le Corbusier, criado para a casa-refúgio homônima. "Estamos todos assistindo as mesmas notícias: é difícil comemorar neste momento. Porém, a ideia de renascer é linda. Estas são as flores que desabrocham depois que a terra queima - elas dão uma sensação de esperança. Elas voltam mais fortes do que nunca. Aqui, elegância é resiliência", admite Blazy. O criativo celebra o cotidiano enriquecendo-o com elementos, cores e formas que se distanciam do rigor e do minimalismo atuais, advindo desse momento histórico que interfere também no modo de se vestir e se comportar. O foco da coleção está nos materiais e no aspecto tátil: franjas, mais ou menos macias, sedas fluidas, lãs esculturais, pregas cheias de movimento. Um guarda-roupa misto completo para várias ocasiões. Destaque para os acessórios que fazem parte do DNA da grife: o resgate da bolsa Sardinha nos novos modelos.
O REINADO DE GIORGIO ARMANI "Winter Flowers", ou flores de inverno, é o nome da coleção de Giorgio Armani para a estação fria do ano. Armani, aclamado como o Rei, fecha a semana da moda de Milão com uma imperturbável elegância. Uma coleção composta por tons de cinza, azul meia-noite e preto, brilhos vivos de rosa e fúcsia. De veludos e cetim, de organza e chiffon, de couro e peles ecológicas incrustadas com rosas, camélias, copos-de-leite e tulipas compõem o jardim armênio em plena floração. Giorgio Armani usa as flores como arma. Com modelos sorridentes quase que flutuando na passarela, ele passa uma mensagem de esperança. Que estes códigos de paz e bondade ressoem pelo mundo!